Sal da Terra, Luz do Mundo

Na sexta-feira da semana passada, no meio da tarde, trafegávamos por uma das mais movimentadas avenidas de Manaus quando escutamos um barulho esquisito no motor do carro em que estávamos. Imediatamente começou a sair fumaça e a luz do painel que acusa um superaquecimento acendeu. Em poucos segundos já sentíamos o cheiro de queimado. O motorista parou imediatamente e acendendo a luz de alarme desceu do carro e abriu o capô. Como era de se esperar não viu nada. Conduziu então o carro lentamente pela avenida, passamos por uma rotatória, que aqui chamamos de bola, e encostamos numa pequena oficina. Foram para mim longos minutos em que eu esperei que o carro pegaria fogo a qualquer momento. A única coisa que fiz foi desatar o cinto de segurança. Felizmente chegamos ao nosso destino.

O lugar era pequeno e atulhado de carros. Ao todo eram uns três mecânicos. Logo deu para perceber quem era o chefe. Um homem, nos seus quarenta anos que logo nos atendeu e detectando o problema disse qual a peça que deveria ser trocada. Foi uma verdadeira aula de mecânica. Depois que meu motorista providenciou a nova mangueira que conduz a agua que refrigera o motor o mecânico executou o serviço nos brindando com mais explicações. O seu sorriso cativante e a forma como trabalhava demonstravam que se tratava de uma pessoa feliz. Quando funcionamos o carro a luz vermelha do painel demorou mais tempo que as outras para apagar. Ele nos tranquilizou dando novamente explicações a respeito do sistema de alarmes do nosso veículo. O importante é que podíamos continuar a viagem. Foi quando ele ficou sabendo de quem era o carro e quem estava dentro dele. Ficou sério, me pediu a benção e fez questão de não cobrar o serviço. Agradeci e partimos para os nossos compromissos.

A figura alegre daquele homem que estava ali na hora certa de resolver um problema e que fez isto com competência e alegria continuou na minha memória. Não sei nada da sua história e das suas condições de vida, nem mesmo sei qual a fé que professa. Só sei que ele resolveu um problema para mim, evitando uma série de transtornos. Ele foi sal e luz na minha vida. Como é bom encontrar pessoas assim, competentes naquilo que fazem, alegres por saber o que sabem e felizes em servir desconhecidos que por mais importantes que sejam tem necessidades e limites que os fazem humanos. E o contrário também é verdadeiro. Como é ruim quando somos atendidos por pessoas mal-humoradas, sem tempo. Aquele homem foi luz e foi sal sem ter consciência disto.

Pessoas assim fazem a diferença. Também não sei quais são suas opções políticas, nem mesmo se está preocupado com os rumos que este país está tomando. Mas o que sei é que no Brasil chegamos aonde chegamos porque há gente que quer o ganho fácil, que não quer servir e que vê no outro sempre um otário em potencial a ser enganado. Talvez volte lá um dia para conhecer melhor este mecânico que do seu jeito fez que a vida fosse melhor vivida naquela tarde que tinha tudo para ser um fiasco, se não tivesse chegado a tempo junto a um grupo que me esperava. Mas aí já é uma outra história.

ARTIGO DE DOM SERGIO EDUARDO CASTRIANI – ARCEBISPO METROPOLITANO DE MANAUS

JORNAL: AMAZONAS EM TEMPO

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